sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Nove Dragões - A Lenda de Nogard


Capítulo 8 – Luta Nas Colinas De Mélis


  
A espada de Merlon saiu da bainha e vislumbrou a noite. O som que ela emitia era um canto de sereia, antigos escritos estavam talhados em sua lâmina, formas e letras que Nogard nunca havia visto antes, a todo instante a espada vibrava, como o dorso de um cavalo enfurecido, a mão firme de Merlon não se movia um centímetro sequer, embora a espada vibrasse e tremesse a todo o tempo. Nogard nunca havia visto uma espada tão bela, sua lamina tinha quase um palmo de largura, o gume era feito de algum material que ele não conhecia, possuía um guarda mão prateado, mas Nogard não pode dizer se era prata de fato, o seu cabo era um emaranhado composto por três raízes grossas, que serpenteavam onde a mão de Merlon a segurava, não possuía pomo, porém as pontas das raízes pareciam perfurar facilmente um inimigo. Nogard se esforçou mas não a reconheceu.
  Mas os Bulks a reconheceram.
  Exitaram por um momento perante o canto da espada, o cavaleiro do Warg no entanto não se mostrou intimidado.
  - Ataquem, seus cães, o que estão esperando?
  - Khar ro, esta louco? Esta é Mitrhiilden, a antiga lâmina de Jaoh’ndar. – respondeu um Bulk menor, que estava com mais medo que os outros.
  Quando os primeiros povos de Andor, os Banedúim, foram derrotados por Dorean e seus exércitos vindos do Leste, ele se tornou Rei. Porém um mau começou a se apossar de seu coração, um mau muito antigo, um mau que os Banedúim se dedicavam a manter preso no sul, uma ameaça que os Jeh’khgari do Leste não conheciam, e esse mau o consumiu. Dorean começou a cometer atrocidades por todo o reino, assassinatos sem motivo algum, roubos e ameaças aos pobres, maltratava sua mulher e seus filhos e coisas piores e mais sombrias ainda. Seu General, Jaoh’ndar, decidiu por um fim aquela mudança, aquela loucura sem limites. Contatou Jeh’khgar, do outro lado do Mar da Névoa, e convocou seu irmão Jaah’ndur, Capitão dos Jakar, os Guerreiros por Nascença. Durante anos eles lutaram contra Dorean e sua tirania, mas o Rei era astúcioso e habilidoso em batalha, nada conseguia detê-lo e sua loucura e tirania prevaleceram. Os Jakar, Jaoh’ndar e Jaah’ndur, refugiaram-se nas montanhas, derrotados. No entanto no inverno que se seguiu eles bateram à porta de Dorean, e dessa vez estavam com seus espíritos elevados, sua coragem renovada e suas esperanças depositadas em um único homem, Jaoh’ndar, e sua recém adquirida espada, Mitrhiilden. A espada sagrada dos Banedúim.
  Deu-se então a guerra, muitos sucumbiram em batalha e outros não tiveram nem mesmo a chance de se defender, mas Jaoh’ndar finalmente se encontrou com Dorean no campo de batalha. Eles lutaram com bravura, coragem e ódio, enfim Jaoh’ndar feriu Dorean, e todos virão seu sangue jorrar, estava negro como jamais poderia estar, o mau já o havia consumido, carne, músculos e sangue. O ferimento foi mortal porém Dorean não sucumbiu, então a aliança de Jaoh’ndar decidiu bani-lo ao Desertos Branco, para que lá ele terminasse seus dias, em agonia e morte. Mas Dorean foi mais ao Sul que qualquer homem de Andor ou Jeh’khgar, e ali ele encontrou aquilo que os Banedúim mais temiam, o mau original..
  Daquele dia em diante Jaoh’ndar escondeu a espada, pois seu poder era grande demais para cair em mãos sulistas, e a memória da espada se perdeu no tempo. Até agora.
  - Ele poderia ser Jaoh’ndar em pessoa seu verme, não me importo – Khar ro avançou em seu Warg para cima de Merlon e das crianças, e muitos seguiram-no -, Morte!
  Merlon brandiu sua espada e o primeiro Bulk caiu sem uma perna, um segundo que havia subido na árvore desceu sobre ele com lamina em punho, Merlon deu um passo para o lado e desferiu um golpe de baixo para cima, tão forte que partiu o Bulk ao meio,
a espada parecia se jogar contra os Bulks com vontade própria, sem parar de vibrar e emitir um canto de sereia, um outro Bulk segurou Arwen pelos cabelos, e a ergueu no ar, somente para perder o braço para Mitrhiilden um segundo depois. Arwen correu e se jogou dentro da carroça.  Nogard estava lutando bravamente com seu galho contra um Bulk que ria a todo instante, mas o garoto acabou levando um soco no queixo e caiu atordoado, quando o Bulk ergueu sua lâmina para acabar com a vida do menino Khar ro deu um rugido.
  - Ele não deve morrer! – ordenou o Capitão dos Bulks em sua voz de trovão.
  Merlon aparou duas espadas negras com sua lâmina, girou se agachando e mais quatro pernas Bulks foram decepadas, o velho estava completamente coberto de sangue negro, então ele viu Nogard, sendo colocado nas costas do Warg, sentiu o coração apertar em seu peito, não posso perde-lo, Dragões me deem força, não posso perde-lo, pensou Merlon desesperado, estava cercado novamente, ele precisava da espada mas não havia outra alternativa, Merlon bradiu Mitrhiilden e lançou-a no ar, em direção ao Warg. O tempo parecia correr sem pressa na Colina de Mélis, a espada foi voando pelos ares, parecia que não atingiria seu alvo, mas mudou sua rota no ultimo instante, como se tivesse vida própria, e foi de encontro ao Warg e lhe decepou a cabeça, Nogard caiu no chão, não havia mais risco de o levarem naquele Warg, o velho suspirou, mas se deparou com a sua situação agora, estava sem espada contra mais de cinco Bulks armados e enraivecidos, ele sabia que Arwen estava na carroça, está segura por enquanto, pensou o velho antes de ser atingido pela lâmina de Khar ro, Capitão dos Bulks, aquele do elmo partido, o golpe transpassou o ombro de Merlon e o cravou à árvore. Nogard recuperou os sentidos e viu em que situação merlon se encontrava, tentou ficar de pé mas o Warg estava sobre uma de suas pernas, se esforçou ao máximo mas não conseguiu se soltar, ficou ali sem poder fazer nada enquanto Merlon estava cercado de Bulks baderneiros e com uma espada cravada no ombro. O punho de raízes de Mitrhiilden estava a poucos centímetros de sua mão, a espada vibrava e pulava na grama como um peixe fora da água, ele tentou empunhar a espada mas era pesada demais, e vibrava demais, para conseguir segura-la.
  Então ele surgiu.
  Veio subindo a colina em um cavalo de guerra castanho, sua capa era verde escura e o acompanhava tremulando como uma sombra, a fogueira deixava sua armadura completamente rubra mas Nogard sabia que não era vermelha, seu elmo cobria-lhe completamente a face, e sob o topo havia um cavalo de aço, a crina do cavalo de aço era tão comprida que chegava ao meio das costas do cavaleiro, um Cavaleiro, pensou Nogard, maravilhado demais para dizer algo. O Cavaleiro aproximou-se cavalgando e saltou por sobre o Warg que prendia Nogard, a visão daquele enorme cavalo de guerra sobrevoando sua cabeça fez Nogard dar um grito de emoção completamente involuntário.
  - Isso, acabe com eles Cavaleiro da Cidade! – todos os Bulks olharam para o cavaleiro ao mesmo tempo, mas já era tarde demais.
  O cavaleiro passou pelo meio da algazarra de criaturas, sua capa e a crina de seu elmo pareciam nadar em pleno ar, ele atropelou grande parte dos Bulks da colina, fez uma meia volta e sacou dois machados de arremesso, lançou-os e dois Bulks caíram mortos, desembainhou sua longa espada e galopou em direção ao restante dos Bulks, aqueles que permaneceram morreram, todos os outros fugiram, exceto Khar ro. O Bulk com o elmo rachado aguardou o momento exato, então golpeou o cavalo com sua lâmina negra, cavalo e cavaleiro beijaram o solo. Quando o cavaleiro decidiu se levantar Khar ro já estava em seu encalço, prendendo-o com uma bota negra ao solo.
  - Quem vem da cidade dos homens? – perguntou Khar ro, mas o cavaleiro não lhe respondeu.
  O enorme Bulk então decidiu revelar o medo nos olhos do homem, retirou-lhe o elmo e vislumbrou um longo cabelo dourado, os olhos verdes e um rosto belo como o amanhecer, não havia medo em seu olhar, o reconheceu de imediato. E gargalhou.
  - Renolon? Ah, hoje deve ser o meu dia de sorte, primeiro esse velho com essas crianças, agora o verdadeiro herdeiro do trono de Andor em pessoa.
  Ao ouvir aquilo Nogard quase engasgou, pelos Dragões, é Renolon o irmão de Arelon, ele é o futuro Rei.
  - Devo dizer que nunca mais verá Arelon, quase Rei. – disse Khar ro erguendo sua espada.
  Então todos virão a lâmina atravessar o corpo de Khar ro, Merlon a segurava do outro lado do Bulk.
  - Volte para as sombras, Escoria Sombria!
  O sangue do Bulk jorrou sobre Renolon e ele caiu sem vida, Merlon se livrou da espada e caiu sentado, exausto.
  Arwen saiu de seu esconderijo com algumas ervas em um pote, estavam totalmente amassadas, veio até Merlon e aplicou a mistura em seus ferimentos, a garota estava corada, e Merlon sabia que era vergonha pela batalha.
  - Não se envergonhe filha, é melhor salvar uma vida do que retira-la.
  O Cavaleiro Renolon levantou-se, olhou para Merlon que lhe acenou positivamente, caminhou até o Warg e libertou Nogard de seu peso, estendeu a mão ao garoto lhe ajudando a ficar de pé.
  - Esta ferido? – perguntou Renolon
  - Não senhor... quero dizer Sor Renolon. – respondeu o garoto pondo-se de joelhos.
  Renolom sorriu amigavelmente. Merlon deu uma bufada de dor enquanto Arwen o tratava.
  - Levante-se garoto, ele tem essa mania Renolon, ele e essa daqui, se ajoelham para todos. – disse Merlon.
  - Não deve se ajoelhar para mim garoto, sou irmão de Arelon mas ainda não sou Rei, e nem pretendo ser. – virou-se para Merlon – Está bem Merlon?
  - Bah, apenas um arranhão, tive que lançar a espada nesse monstro de quatro patas maldito, não tive outra escolha, ei garota esta passando essa meleca de plantas no meu pescoço, acho que não fui degolado, não ainda.
  Arwen estava olhando para Renolon em estado de choque, sua mão movia-se espalhando a mistura de plantas mas ela não dava a minima atenção para Merlon, Renolon era jovem, era belo e era um Cavaleiro.
  Então Renolon viu a espada, Mitrhiilden, estava quieta e já não vibrava nem pulava mais, estava tão silenciosa quanto a noite, segurou em seu cabo de raízes e fitou a lâmina, desde a base até sua ponta.
  - O poder nessa arma é tão inimaginável. – e deu um sorriso tímido.
  - Renolon? – advertiu Merlon.
  Renolon o olhou por sobre o ombro, a crina de seu elmo dançava ao vento, então ele levou a arma até Merlon, ajoelhou-se e a entregou.
  Merlon a pegou rapidamente, e estendeu a mão para que o jovem Cavaleiro se levantasse.
  - Não deve usa-la, meu caro Cavaleiro, mas pode nos ajudar a entrega-la na mão de seu verdadeiro dono.
  Renolon se levantou, olhou para Nogard e falou.
  - Eu irei ajuda-lo.

  Eles recolheram as poucas coisas que não estavam manchadas com o sangue negro das sombras, e partiram, madrugada adentro, rumo a Pescoço dos Homens, mas dessa vez iam escoltados por um verdadeiro Cavaleiro da Cidade, Renolon, irmão do Rei Arelon. Que misteriosamente havia se ajoelhado perante Merlon.


Encontrou algum erro, tem críticas ou sugestões?
Reaja e comente!!



Licença Creative Commons
Este obra foi licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Brasil.




Nenhum comentário:

Postar um comentário