Capítulo
9 – Um Primeiro Presente
- Você tem noção do
que esta fazendo Nogard? – perguntou Arwen, que estava espantada e feliz ao
mesmo tempo – Esta montando um Gravas, um cavalo sagrado.
Nogard estava cheio
de si, mas sua postura era inadequada e seus comandos imprecisos, não estava
com medo, apenas apreensivo, por Arwen.
- E você acha que eu
não sei disso? Olhe como ele é forte, e como pisa suave, parece que estou
montando as nuvens. – tentou parecer forte, mas foi traído pela sua idade -
Estou tão grudado a essa sela que minhas pernas estão com câimbras, acho que
quando chegarmos a cidade não poderei montar por uma semana.
Renolon e Merlon
estavam dividindo o banco de condução da carroça, e não conteram as
gargalhadas, afinal não se pode ver uma criança montando um Gravas todo dia, e
ainda por cima reclamando de câimbras.
- Eu disse para não
deixa-lo montar Renolon, as crianças de hoje em dia não aprendem mais nada da
maneira certa. – disse Merlon.
Renolon olhou para
as crianças e sorriu, deu um tapa nas costas do velho Merlon.
- Ah Merlon,
deixe-os, tenho certeza que jamais montou um cavalo antes de aprender a arte da
montaria por completo, mas esses são novos tempos, novas leis e novos acontecimentos.
– seu semblante ficou sério, o elmo pareceu pesado demais para o colo, então
ele o atirou dentro da carroça – Chegou um mensageiro de Angur a três dias.
Merlon movimentou o
braço afim de sentir o ombro ferido, ainda estava doendo muito, mas ele aprendera
a ignorar coisas como aquela com o passar dos anos.
- Arelon? –
perguntou sem tirar os olhos da estrada.
Renolon acenou
positivamente.
- Sim, parece que
esta muito doente, não sai de seu quarto a dias, não come e seu único sustento
é o vinho, os Curistas estão preocupados, não sabem dizer o motivo da
enfermidade nem de que tipo ela se é.
- O velho Arelon
ainda não partirá, meu caro Cavaleiro, ele ainda tem coisas a fazer em Andor, e
coisas a contar, o velho guarda segredos demais, esse é seu pecado.
Renolon olhou para
as crianças, estavam brincando em cima do grande Arkas, não parecia haver
problemas para elas, seus sorrisos eram honestos e verdadeiros, não havia ontem
ou amanhã, apenas o agora em suas cabeças, a verdadeira pureza da juventude.
- Merlon, vocês se
conhecem desde crian...
- Não comece
Renolon, não hoje, não nesses dias que se seguirão, Arelon fez coisas terríveis
para Andor, coisas vergonhosas, que eu jamais irei concordar ou esquecer. –
Merlon fitou as muralhas que se aproximavam a cada hora – Ele não era assim,
costumava ser bravo e destemido, era um Rei à moda antiga, liderava os homens
no campo de batalha e lutava com eles, ombro a ombro, coroa e elmo partilhavam
dos mesmo perigos, dos mesmos ferimentos e das mesmas vitórias, jamais senti
maior prazer do que servir Arelon e Andor, mas ele mudou – o velho balançou a
cabeça -, eles sempre mudam, espero que o próximo seja diferente. – disse isso
e fitou Renolon.
- Sim, é o que todos
querem. Também chegou um mensageiro de Lago do Rei.
Merlon encarou o
Cavaleiro em sua armadura, uma grossa sobrancelha estava erguida, daquela forma
que só Merlon sabia encarar uma pessoa.
- O que a fortaleza
das águas tem para dizer?
- Fizeram uma
excursão, mandaram seus melhores homens para os Postos de Sentinelas, através
da Floresta Escura, para recolherem informações, e o que eles disseram não é
agradável. – passou a mão pelos cabelos dourados – Alguns meses atrás quatro
tropas de Bulks foram vistas abaixo do Mar das Sentinelas, os homens de Águais
aprontaram os barcos durante a noite e impediram a travessia, mas alguns Bulks
conseguiram adentrar a Passagem de Gotum.
- Quantos? –
perguntou Merlon, assim que o Cavaleiro da Cidade terminou de falar.
- Uma tropa,
inteira, cerca de uma centena, devem estar perdidos no Grande Paredão, mas irão
encontrar a saída, e quando fizerem isso, devemos estar preparados, um ataque à
retaguarda dos Postos pode ser fatal, a vigilância é voltada ao sul, não
podemos permitir esse ataque.
- Devemos contatar
Lorde Doufas – disse Merlon assumindo seu antigo posto, instintivamente, mas
percebendo logo em seguida que não era mais General -, você deve contatar Lorde
Doufas, e rápido.
Renolon sacudiu a
cabeça, seus belos cabelos louros dançaram ao vento.
- A cidade de Força
está ocupada demais com sua guerra inútil, não irá nos ajudar com suas forças,
e Porto Vitória não deixará a cidade desguardada, os homens lutam entre si, mas
partilham de um mesmo inimigo, os do Sul, precisamos convocar os Ponta Lancenses.
Merlon coçou a
barba.
- Tem razão
Decadência, mas não sei quais alternativas restam. Ah cale a boca, eles não
virão. – Renolon já conhecia a mania de Merlon, isso não o surpreendeu, Merlon
então voltou a falar com o príncipe – Eles não virão, os Ponta Lancenses não
virão por cem monstros daqueles, cem Bulks não representam ameaça para eles,
eles amam a batalha mas também amam o desafio.
- E então o que devo
fazer? – perguntou Renolom
- Deixe comigo,
quando chegarmos à cidade farei as coisas andarem novamente, Andor esta parada
tempo demais, e os sulistas estão se movimentando, sinto isso em meus ossos, e
nesse maldito anoitecer antecipado.
O dia já começara a
escurecer, pouco mais de meio-dia todos sabiam, mas dessa vez não haveria
descanso, Merlon e Renolom decidiram que todos viajariam naquela noite, a
mensagem de Águais deixara o velho inquieto, agora você fica ai nessa cama quente, enquanto o velho Merlon aqui
resolve seus problemas, alteza, pensou Merlon lembrando-se de Arelon. Não
haveria pausa, eles chegariam nos portões na próxima madrugada, ele entregaria
suas lanças e iria assumir seu antigo posto, mesmo contra sua vontade.
Arkas e Nogard já
pareciam velhos amigos, Arwen pegou no sono no meio da noite, e Renolom a
colocou na bagagem da carroça, mas Nogard não estava com sono.
- Acha que consegue
domar um animal dessa natureza jovem? – perguntou Renolon.
Nogard apertou as
rédeas.
- Acho que posso
tentar, mas precisarei de ajuda para montar.
Renolon sorriu.
- Muitos Cavaleiros
do Rei tentaram montar esse cavalo Nogard, e todos fracassaram, eu sou o único
que conseguiu sua autorização. Os Gravas não são como os outros cavalos, eles
não podem ser domesticados, nem mesmo adestrados, quando um Cavaleiro monta um
Gravas, não é o Cavaleiro que esta escolhendo sua montaria, é o cavalo que esta
escolhendo seu Cavaleiro.
Aquele comentário
fez Nogard pensar, será mesmo que um
Gravas pode escolher um Cavaleiro? Será que Arkas me escolheu, ou só deixou que
eu lhe montasse pois sou uma criança?
- Sabe a quanto
tempo monto Arkas, Nogard? – perguntou Renolon, enquanto Merlon fumava seu
cachimbo e sorria.
- Não sei, cinco,
talvez dez anos.
- Uma noite.
Nogard olhou para
Renolon sem entender nada, uma noite?
- E apenas me deixou
montar no momento em que eu lhe contei que viria em seu encontro. – disse
Renolon ajeitando-se no banco de condução – Acha que eu preferiria esse duro
banco de madeira, a montar um Gravas meu jovem? Creio que não, espero que cuide
bem dele Nogard, pois esse cavalo o escolheu – Nogard arregalou os olhos
espantado -, esse cavalo é seu Nogard.
Pelos Dragões, agora
só preciso de uma espada.
A noite correu como
o vento, Arwen estava sendo acordada por Merlon, Nogard estava tão maravilhado
com seu presente que sequer reparou nos portões da cidade, à sua frente. Eles
se abriram e então o garoto ergueu os olhos, era um enorme portão de ferro,
preso por correntes com elos do tamanho de um homem, eles passaram pelo arco
imenso, Nogard pode ver a grossura da muralha.
- Senhoras e
Senhores – disse Merlon -, a cidade de Pescoço dos Homens, onde aquele homem
que não se protege acaba sem pescoço. – e ganhou um olhar de repreensão de
Renolon, pelo comentário.
Os olhos das
crianças brilhavam, maravilhados, jamais poderiam imaginar que uma muralha
podia ser tão alta.
Dois homens os
esperavam, um era um humilde serviçal, vestidos com sedas brancas, era
extremamente magro mas não parecia faminto, o outro era um homem belo, jovem e
elegante, com olhos escuros e brilhantes, um nariz pequeno e um longo cabelo
negro, amarrado sobre a cabeça, ostentava um sorriso bondoso, estava imponente
em um traje de cetim vermelho, uma faixa passava por trás de seu pescoço e se
enrolava em seus braços, uma faixa dourada com muitas pedras preciosas.
- Merlon. – disse o
homem jovem e elegante, fazendo uma reverência.
Merlon sorriu,
desceu da carroça e deu um abraço no homem, algo que o deixou um pouco
constrangido.
- Meu amigo – disse
Merlon ao homem com a faixa, virou-se para Nogard e acenou para que ele se
aproximasse -, Nogard, este é Jih’ndo, o homem que lhe deve um presente.
- Meu Senhor. –
disse Nogard, que só não se ajoelhou pois a ponta da bota de Merlon não deixou.
- Meu caro garoto,
temos muito o que conversar – disse Jih’ndo, com um forte sotaque Jeh’khgari -,
e muito a aprender, espero que goste de espadas, pois nos próximos meses é
apenas isso que você irá ver.
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