Capítulo 5 – Despedidas
- Psiu, acorde
filho – Serena estava ao lado da cama de Nogard, segurava uma vela pequena em
um suporte rústico de madeira -, Nogard vamos, vai se atrasar.
O garoto acordou
parcialmente em meio às sacudidas de sua mãe, piscou e esfregou os olhos, olhou
para fora viu que ainda era madrugada e deitou novamente, não quero levantar agora, ainda não é nem manhã, pensou Nogard em
meio a bocejos e resmungos.
- Parabéns pelo seu
aniversário meu filho – disse Serena abraçando Nogard.
- Obrigado mãe –
respondeu o garoto ainda de olhos fechados -, vou ganhar algum presente esse
ano.
Serena suspirou.
- Vai, mas seu
presente está com Merlon, vamos levante, ele já deve estar lhe esperando.
- Ah mãe, não é nem
manhã ainda – disse com uma voz preguiçosa e cheia de sono -, Merlon ainda deve
estar dormindo, e esta muito frio para sair lá fora e deixar meu cobertor aqui.
Serena não brigou
com ele. Serena também não gritou ou discutiu, ela sabia que Merlon já devia
estar acordado e aprontando sua carroça a um bom tempo, porém apenas virou-se e
saiu do quarto. Nogard ouviu a porta batendo e se aconchegou sob seu cobertor
de couro de cabra, a noite estava particularmente fria, sob seu cobertor ele se
sentia abraçado pelo calor, estava tão confortável que podia dormir por dois
dias seguidos, porém quando Serena puxou seu cobertor e despejou uma caneca de
água fria em suas costas Nogard levantou-se mais rápido do achava que podia.
Sua mãe não conteve
um sorriso.
- Bom dia cavaleiro,
perdoe-me pelo banho mas não teria tempo de aquecer a água e encher a banheira.
– Serena disse isso com o sorriso mais terno do mundo nos lábios.
- Esta bem então. –
disse Nogard se apressando para trocar de roupa, afim de amenizar o frio.
Havia um saco grande
de roupas ao lado da porta de entrada, algumas roupas e provisões que Serena
aprontara durante a noite, ela sabia que Merlon arcaria com todas as despesas
da viagem, mas também sabia que ele era o ferreiro mais pobre de Ferro Forte, e
apesar dela também não estar nadando em rios de ouro queria ajudar a sustentar
seu filho naquela viagem de negócios.
- Preste atenção a
tudo que Merlon fizer e disser, nesse ramo é importante entender aquilo que o
comprador deseja, se algum homem deseja um escudo de pano você o faz, você não
argumenta ou diz que será frágil, você apenas o faz, faça amizade com os homens
de armas que estarão por lá e sempre diga que é de Ferro Forte, entendeu? –
explicou Serena arrumando o saco de provisões nas costas de Nogard, que se
queixava do peso.
- Sim mãe. – disse
Nogard virando os olhos, abriu a porta – Merlon vai me ensinar tudo, tenho
certeza.
Serena o olhou com
ar de desconfiança, Nogard não gostava da ideia de ser um ferreiro e Serena
sabia disso, mas decidiu não dizer nada, era cedo demais e Nogard carregava
muito peso para um garoto. Abaixou sobre um joelho e beijou a testa do filho,
um beijo longo e amoroso que revelava todo seu receio, abraçou Nogard com tanta
força que o garoto engasgou.
- Eu te amo, e que
os Dragões te guiem.
- Eu também te amo
mãe, eu vou caminhar nas sombras de suas asas.
Nogard saiu por
entre as vielas da vila dos ferreiros, deixou sua mãe para trás com uma vela
trêmula, numa noite escura e fria, não queria olhar para trás pois sabia que
sua mãe estaria chorando ou viria até ele cancelando aquela coisa toda, não se preocupe mãe, vou me tornar um
cavaleiro e vou salvar o reino, trarei presentes e ouro para a senhora, eu juro,
prometeu e jurou o garoto. Um juramento de criança, mas que não valia menos que
um juramento de um adulto. Pelo menos para Nogard, filho de Bemiron, o Grão
Arqueiro.
A subida foi longa,
a noite fria drenava suas forças e o saco pesava a cada passo, enfim viu a
longa carroça de Merlon, já estava carregada e coberta com uma grossa lona, pelo menos frio ela não vai sentir,
pensou o garoto, que já sabia que Arwen estava ali, escondida em meio às lanças
e espadas. Nogard jogou seu saco no chão e olhou para Merlon.
- Posso expl...
- Não precisa se
explicar jovem, você não é obrigado a ir trabalhar – disse Merlon, referindo-se
à falta de Nogard ao trabalho no dia anterior -, sei que não fez por mal, vamos
me dê aqui esta saco, vou coloca-lo com as lanças.
Nogard congelou,
evidentemente que não pelo frio, mas pelo fato de que Merlon poderia descobrir
Arwen ali, provavelmente Merlon havia aprontado a carroça a algum tempo e Arwen
se esgueirou para dentro dela depois que o velho ferreiro foi pegar os cavalos.
- Não há necessidade
meu senhor – disse Nogard segurando firmemente a corda do saco -, eu faço
questão de levar no banco de condução. – e sorriu com ternura.
Merlon coçou a
barba, aquilo era mais um cacoete, que uma demonstração de reflexão.
- Tudo certo então,
assim seja, podemos ir enfim? Ou falta algo ainda?
Nogard colocou o
saco no banco de condução, não sem muita dificuldade, e sentou-se. Os cavalos
de Merlon eram dois garanhões brancos, magros e feios, eram os cavalos de
guerra de Merlon, mas a muito tempo não guerreavam, nem mesmo puxavam tanto
peso.
Merlon sentou-se ao
lado do jovem, acendeu seu cachimbo e lambeu o dorso dos cavalos com as rédeas,
no mesmo instante os cavalos começaram a se mover, e Nogard teve uma certeza, agora começa a minha aventura.
- Senhor Merlon,
minha mãe me disse que você tinha um presente para mim, posso vê-lo?
Merlon sorriu com o
cachimbo na boca, deu uma baforada lenta e continua.
- Seu presente está
em Pescoço, existe um homem lá chamado Jih’ndo, quando chegarmos ele lhe dará
seu presente.
Passaram pela baixa
cerca de madeira que representava os limites da vila, a sua frente havia um
enorme campo de trigo, e depois altas colinas verdes, e aquilo que Nogard podia
ver da vila, aquilo que ele viu desde criança, as muralhas de Pescoço dos
Homens.
- Tem razão
Decadência, não poderia deixar isso acontecer, não, seria uma tristeza para
todos nós, ora é claro que vou fazer algo, acha que sou um assassino de
crianças? – conversaram mais uma vez Merlon e sua inseparável cicatriz.
Nogard não lhe deu
atenção, estava perdido em pensamentos, imaginava como seria Pescoço dos Homens
por dentro, suas muralhas eram altas e cinzentas, mas a verdadeira cidade não
era apenas uma muralha, ali dentro viviam milhares de pessoas, e dentre todas,
aquelas que Nogard mais queria conhecer, os Cavaleiros do Rei.
- Jovem, cuidado com
as costas, essas lanças estão bem afiadas, eu mesmo as afiei e posso garantir
isso, a ultima coisa que queremos é uma criança ferida nessa viagem não?.
Nogard passou a mão
no encosto do banco de condução e não sentiu ponta alguma.
- Não estou sentindo
nada aqui. – respondeu ainda tateando o encosto.
- Ora pare de ser
bobo garoto, não estou falando com você, estou falando com a garota que esta
escondida na bagagem. – disse Merlon sem tirar os olhos da estrada. – E espero,
para o bem de vocês, que ela tenha trazido alguma coisa doce para nós comermos
na viagem.
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